Terça-feira, 30 de Novembro de 2004
Na estrada da vida
Ás vezes nascem flores
Em lugares ermos
De dura luta
Para abrandar as nossas dores.
Flores ao longo da estrada
Como para perfumarem a minha dor
Que só pela graça
Dava beijo abençoado
Opera o milagre do amor.
Um anjo que me falou de longe
Voz que de coração aberto
Deu-me a coragem
Com que hoje os meus passos
Sejam menos incertos.
Anjo que habita na terra
Um anjo meu guardião
Gente que combate a guerra
Que trás a paz
E alegria ao meu coração.
Um anjo que ficará
Na minha lembrança
Memória de sentimentos - seus
Bem haja porque trás
No peito uma criança
E as crianças pertencem a Deus.
Beijei a tua oferenda
Não como ouro desejado
Mas como rara prenda
Filha do céu abençoado
Anjo filho das madrugadas
Alma de coração afoite
Um anjo de asas abertas abençoadas
Que soube rasgar a alvorada
Para que estes meus versos
Possam novamente cantar
Nas noites.
João Miranda
Terça-feira, 23 de Novembro de 2004
Oh! Se eu pudesse
Se eu pudesse ser poeta
Se as palavras eu soubesse
Dispôr pela ordem certa.
Escreveria sobre a vida
As verdades que sei
Mas eu não encontro saída
Estou sempre no começo.
O que sinto vos diria
Duma forma bem concreta
Se eu soubesse poesia
Se eu pudesse ser poeta.
Escreveria sobre o amor
Poesias sem parar
Poesias ao sabor
Da minha forma de amar
Escreveria sobre ti
Causa da minha razão
E daquela que se ri
Pela tua situação.
Escreveria mil poemas
Odes sonetos canções
Escolheria os melhores temas
Para as minhas composições.
Gosto bem de poesia
Dos poetas que eu entendo
Sem saber eu o fazia
Estas quadras fui escrevendo.
João Miranda
Quinta-feira, 18 de Novembro de 2004
Andava como um navio
Bailando em maré viva
E fitava altivo o azul
Num jeito forte no olhar
Por vezes mudava a cor desse fitar
Ora azul de mar e céu
Ora cinza de tempestade.
Cresceram-lhe pestanas de musgo
De tantas lágrimas vertidas
Nas muitas despedidas.
Do sorriso vermelho
Trémulo e doce como ambrósia
Ia aspergindo um perfume
De flores do campo ligado à maresia
Poisaram-se-lhe açucenas nos cabelos
E o vento desprendia-os em fio.
Até que o corpo em balanço
Se inclinava à terra
Sulcado por sóis e por luas
E crescendo no mar salgado do destino
Agora longe de sereias seminuas.
João Miranda
Quarta-feira, 17 de Novembro de 2004
Começaram a cair
É vê-las todos os dias
Batidas pelo vento
Rodopiando rodopiando
Como loucas...
Não sei se choram de alegria
Ou se choram
Por um tempo
Que já não é seu,
Soltaram-se da árvore mãe
E em círculos de revolta
Esboaçam sem parar
Enchem os caminhos
De poalha doirada
Enquanto os mais velhos
Agasalhando a alma
Se lamentam
"Chegou a nossa estação
Caíremos com ela".
E que importa?
Melancolia no outono?
Porquê?
Se o amarelo da paisagem
É sinal de tanto
Que se deu à vida!
Podemos ser folhas caídas
Mas não são
Folhas mortas...
Tem história
Estiveram no alto
Onde foram admiradas
E queridas
Acolheram namorados
Velhos e crianças...
Viram muito mais de perto
A lua e as estrelas
Entrelaçaram esperança,
Guardaram segredos
É hora de partir?
Pois seja!
Mas em coreografias
Tão belas
Beijando tudo e todas
E caindo sem medos.
João Miranda
Terça-feira, 16 de Novembro de 2004
Uma criança que baloiça
Uma árvore no deserto
Musica suave em que se oiça
A fonte fresca por perto.
Gotas de orvalho numa flor
Uma borboleta que aparece
Uma caricia de amor
A brasa que não arrefece.
Um pião uma bola
Um pardal que saltita
Uma flauta uma viola
Um cão catita.
Uns seios à mostra
O vai vem do mar
A espuma dentro da ostra
Um cavalo na areia a galopar!
João Miranda
20-03-2004
Tu podias vir como um barco
Ser toda a espuma do mar
Seres iris da beleza em arco
Tu podias podias tirar a lua ao luar
Tu podias ser tudo e tardas
Tu podias ser ave e voar
Sonhar o coração das palavras
Tornar perfeito o sonhar!
João Miranda
11-01-2004
Segunda-feira, 15 de Novembro de 2004
Trocamos cumprimentos por simpatia
Trocamos ideias para nos defenir
Trocamos angustias para aliviar
Trocacamos sorrisos ao telefone
Para inflingir dentro de nós
Mais poesia!
Trocamos cartas que formaram um verso
Esculpido no amor puro
Sem preconceitos...
Trocamos a alma sem dar conta
Trocamos olhares sem nos vermos
Não trocamos beijos
Por estarmos longe
E por mal parecer!
João Miranda
Sábado, 13 de Novembro de 2004
Pedro Homem de Melo
De fino trato mas singelo
E professor meu por opção
Homem de grande alento
Escrito de raro talento
E poeta sim por vocação
Foi há um século que nasceu
E para o mundo não morreu
Este ilustre "tripeiro"
Por todos será lembrado
E povo consagrado
Admirado pelos artistas
Fez versos para fadistas
Viveu a noite e o dia
Mas foi o povo rural
Que lhe deu em Portugal
Mais afecto e alegria
Partiu longe de nós
Mas seus versos sua voz
Ficaram para além do tempo
Deixou-nos a nostalgia
Da sua bela poesia
Recheada de sentimentos.
João Miranda
Quinta-feira, 11 de Novembro de 2004
Na mais velhinha esplanada
Novinha em folha
Estavas tu enamorada
Ó velha nau peregrina!
Latina...
De vela traçada sem mastro
A baloiçar algures à toa
No cais de nenhures
Dentro e fora do Porto
Assim eu te vi um dia
A estender a linha
E o anzol
A quem passava...
Triste fado
Triste sina
Dar novos mundos ao mundo
E ter o destino marcado
Num alegrete sem lastro
Como se fosse cachopa
Desta europa que te ilumina!
A velha nau lusitana
Sentada assim sem escolha
Na mais velhinha esplanada
Novinha em folha!
João Miranda
Segunda-feira, 8 de Novembro de 2004
Imprimo nas areias desta praia deserta
As marcas do meu corpo sem presença
Neste imenso céu aberto longínquo
Onde repousa este olhar vago esta indeferença...
Ao rochedo onde agora me sento
Confesso a solidão que sinto
O desalento que me invade
Alheio ao mar ao sol ao vento...
Ver ao longe o horizonte
É imaginar o limite de vida
Cujo percurso faço a cada passo
Como as ondas nesta areia entristecida
Desperta em mim o cântico
Duma sereia oceânica salgada
O relinchar do cavalo alado
Branco musculado galático
Céu mesclado de branco ensanguentado
Tarde que se esgota em melancolia
Alvorada que se avizinha em desalento
Deste setembro infinito que eu invento...
João Miranda